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BalCast #11 – Pare de fazer rendas

Tempo de leitura: 7min

Há mais ou menos duas semanas, fui fazer um trabalho em Fortaleza e consegui alguns dias durante a minha estada apenas para descansar. Em um dos passeios que realizei por lá, parei nas chamadas mulheres rendeiras. Era uma espécie de comércio, onde estavam reunidas algumas mulheres com idade entre 50, 60 e 70 anos. Elas faziam coisas maravilhosas!

Eu nunca tinha visto aquilo pessoalmente, ao vivo, nunca tinha presenciado estas rendas! Para você que também nunca viu me entender melhor, é muito fácil: imagine uma senhorinha sentadinha, tendo à sua frente uma espécie de barril de madeira, de onde pousam algumas linhas, e, em suas mãos, algumas bolas igualmente de madeira, cada uma conectada a uma das linhas. Começa, então, um jogo de mãos onde ela coloca uma bolinha para cima, outra bolinha para baixo, depois puxa e os fios começam a se entrelaçar, entrelaçar, fazendo assim as rendas. Para ilustrar, imagine um tear (aquela máquina de fazer rendas, blusas e todo tipo de confecção): é mais um menos isso, um tear, só que manual.

Esse jogo de mãos é uma das coisas mais incríveis que eu já vi, porque a técnica era algo excepcional! Enquanto uma bolinha ia para cima, a rendeira já puxava e torcia e dois pra lá, três pra cá… Era mais ou menos um tricô, mas em um nível muito mais rápido. Um tricô hard! Realmente, uma coisa incrível. Se você quiser saber do que estou falando, coloque no YouTube “mulher rendeira”. Claro que vai aparecer a música logo de cara, mas você também encontra vários vídeos das mulheres fazendo renda.

Bom, eu fiquei entusiasmado e comecei a conversar com elas, perguntar e vi que tinha uma espécie de blusinha toda rendada à venda. Era uma regata, com várias rendas e toda feita à mão. Perguntei a essa senhora que descrevi acima quanto custava aquela blusinha. Eu já imaginava algo do tipo R$250,00, R$300,00, até R$400,00. Foi então que me surpreendi: aquela blusinha custava R$70,00! Até falei “Como R$70?” e ela me respondeu que poderia fazer um desconto! Meu olho arregalou porque aquele serviço por menos do que R$400,00… Não era  possível, todo feito à mão!!

Aquilo começou a me coçar e fiquei mais pasmo depois. A minha coceira mental aumentou quando eu a vi fazendo a renda e perguntei-lhe quanto cobrava pelo metro. As rendeiras vendem estes metros para quem quiser fazer um bordado ou usar a renda para algum tipo de decoração. A senhora falou: “Olha, essa daqui está mais ou menos R$9 ou R$10 (o metro), mas eu faço por R$8,00 para vender mais.”

Oito reais o metro de uma renda que não sei quantas horas ela fica pra fazer!! Pra você ter uma ideia, depois de entrelaçar, entrelaçar, entrelaçar… coisa de 20, 30, 40 segundos, quase um minuto fazendo, aquilo não tem nem meio centímetro. Perguntei para aquela senhora como ela poderia cobrar R$8,00 pelo metro daquele trabalho. Ela pensou que eu estava considerando caro ainda e expliquei que era justamente o oposto, eu estava achando muito barato. O pior é que não só ela, mas todas as outras mulheres vendiam a renda a este preço.

Fico imaginando: chega um gringo em Fortaleza, uma cidade turística, e leva aquela blusinha de R$70,00 por US$20,00, além de metros e mais metros de renda pagando praticamente nada, uma mixaria.

Agora, pensando em negócios, na empresa da renda, onde é que está o problema? Por que este produto, este trabalho delas está tão desvalorizado? Se você vir isso ao vivo vai me entender. E o problema é simples: elas NÃO PARAM de fazer renda!

Eu fico imaginando gerações e gerações de mulheres rendeiras que pensam apenas na parte técnica, apenas em colocar as bolinhas de madeira para cima e para baixo, pensando apenas em FAZER a renda. É importante explicar que não estou colocando estas coisas e fazendo isso para falar mal delas. Pelo contrário! O trabalho daquelas mulheres é algo maravilhoso. Porém, penso que quando há um hiperfoco, aquela dedicação exclusiva e exagerada, você se reduz à sua técnica ou ao seu produto apenas. No caso das rendeiras, então, o valor delas está reduzido ao valor da matéria-prima que utilizam. O que quero dizer é que elas só fazem isso, só pensam nisso e imagino que elas peguem o valor do fio, coloquem um pouquinho a mais pelo tempo delas e vendam.

Quando falo das rendeiras, falo também dos artistas, de engenheiros, administradores e de você que passa a vida desenvolvendo um único lado do seu trabalho: a técnica. Foca-se somente nisso e não pára para pensar em outras coisas, como o marketing, a distribuição, a valoração e valorização do que você faz.

Desde pequeno, eu já tive várias profissões diferentes. Trabalhei como baterista de uma banda, como mágico, professor de cursinho, engenheiro (aliás, sou formado nesta área) e hoje trabalho como palestrante e hipnólogo. Aprendi desde cedo a não ficar imerso, engolindo da mesma água o tempo todo, não ficar mergulhado em uma técnica ao ponto de não ver mais nada.

Essas senhoras rendeiras, pelo que conversamos, não dão o valor necessário ao produto simplesmente por elas serem, viverem, comerem e respirarem o produto. Para elas, aquilo é normal, algo sem valor. Então, quando você sai um pouco do que faz, quando para de fazer o que sempre fez e vai respirar outros ares, ouvir outras opiniões, vai entender o que se passa fora da sua caixa, você começa a dar valor ao seu trabalho e seu produto. Infelizmente, a gente se acostuma com nossa atividade e acaba pensando que qualquer um faz o mesmo e não é bem assim… Temos que valorizar o que fazemos bem.

Pare um pouquinho, nem que sejam 10 minutos por dia ou um dia em sua semana, e comece a olhar para outros horizontes, aprender novas habilidades. Talvez, você aprenda a montar uma equipe para te ajudar em seu trabalho e, saindo um pouquinho do foco (só um pouquinho), talvez volte também com muito mais ideias para fazer seu produto ganhar outras proporções.

Não foi mágica, apenas uma mudança consciente de foco. Troquei de canal para levar minha vida pra passear um pouco. Para soprar algumas nuvens. Para respirar melhor. Ao permitir que o pensamento se dissipasse, abri espaço para mudar meu sentimento. O problema continuava no mesmo lugar; eu, não. Nós nos encontraríamos outras tantas vezes até que eu pudesse solucioná-lo, mas eu não precisava ficar morando com ele enquanto isso.

É assim que a escritora Ana Jácomo lida com os problemas dela… passeando e voltando com novas ideias. E se pensarmos que o que fazemos é um “problema passível de uma solução”, vale a pena soprar algumas nuvens, levar a vida para passear e voltar com corpo e mente novos.

Você quer que seu negócio cresça? Então, pare de fazer renda… e comece a namorar.

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SOBRE
RAFAEL BALTRESCA

Professor e palestrante desde 1999. Formado em Engenharia Eletrônica, iniciou sua carreira dando aulas de cálculo numérico e lógica de programação em escolas especializadas em reforço ao universitário.

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